Sobre estar sem palavras
29 de maio de 2016



Numa definição bem rasteira, a função de um jornalista seria descrever situações em palavras - e, quando for o caso, interpretar essas situações. Um pouco de talento, um bocado de técnica e um punhado de experiência acabam tornando essa tarefa bem mais fácil. Só que às vezes a realidade se encarrega de nos deixar sem palavras. Foi o caso do estupro de que teria sido vítima uma garota de 16 anos com a participação de nada menos que 33 criminosos. Como se não pudesse ficar pior, a barbárie veio à tona por conta de um vídeo (que tive a satisfação de não assistir em função da repugnância das imagens, de acordo com relatos de quem teve o desprazer de vê-las) em que, entre outras coisas, um dos envolvidos debocha da situação.

Estupro é uma coisa inaceitável para qualquer pessoa normal. É complicado até entender como alguém tenha prazer num ato sexual em que a outra pessoa envolvida está sendo agredida e obrigada àquilo.

Apesar de tudo, no caso em questão imagina-se que, em função da repercussão do negócio, os acusados sejam rapidamente localizados e devidamente punidos, ao contrário do que acontece com os inúmeros casos de estupro que ocorrem diariamente no país - só no Rio de Janeiro, foram quase 1.500 casos apenas nos primeiros quatro meses do ano. Algo em torno de uma agressão a cada duas horas. Mesmo que fosse uma por ano seria algo inaceitável, mas uma a cada duas horas apenas em um estado da federação e levando-se em conta que são contabilizados apenas os eventos denunciados (muitas mulheres ainda deixam passar batido por vergonha ou por medo de que duvidem delas) é algo que nos leva a concluir que a civilização está em processo falimentar.

Mas, quando você pensa que chegou no fundo do poço, aparece um sujeito com uma pá e uma disposição invejável de continuar o trabalho. Não bastasse tudo isso que aconteceu, ainda teve gente com a desfaçatez de querer justificar o estupro. Nunca a expressão "justificar o injustificável" fez tanto sentido.

"Ela tem 16 anos e já tem um filho de 3." Pra quem diz isso, quatro letras: e daí? Desde quando o fato de ela ter engravidado aos 13 anos justifica uma horda de bárbaros dopá-la e violentá-la? O argumento é tão raso que nem merece resposta.

"Ela tinha saído para farrear". Sim, ao que tudo indica ela tinha saído para fazer uma farra. Não para ser agredida. Dá pra sacar a diferença ou precisa desenhar?

"Ela estava de roupa curta." Como disse o grande chapa Fabiano Negri, nem que ela estivesse nua isso se justificaria.

Resumindo: não, ela não mereceu o que fizeram com ela. Tem que pegar quem fez isso e punir exemplarmente. E tem que pegar quem acha essa barbaridade algo justificável e abrir a cabeça do sujeito a machado - não por violência, mas pra descobrir o que tem dentro.

Nenhum comentário:

Postar um comentário